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Interseccionalidade

No artigo “A saudade da terra na América: memória cultural e experiências de mulheres portuguesas na intersecção de Culturas” (1993), Feldman critica que os estudos etnográficos realizados até aquele momento sobre as mulheres portugueses imigrantes nos EUA tinham enfoques reducionistas, pois as categorizavam enquanto classe, a priori como “operárias”, ou enquanto grupo étnico, simplesmente como “portuguesas”. Eram excluídos das análises os significados que os próprios imigrantes atribuem às suas experiências migratórias e as suas vivências entre culturas, bem como processos de fragmentação e reconstrução de identidades implicados pela migração. 

Feldman também critica que até então as análises dos papéis de gênero ocupados por estas mulheres migrantes, se davam sob um olhar impositor de paradigmas feministas (brancos) norte-americanos, denunciando de forma simplista a dupla jornada de trabalho feminino e as relações de poder entre os sexos, sem considerar processos complexos de reinvenção dos papéis de gênero provocados pela especificidade da experiência da migração e o encontro de valores culturais conflitantes.

Em contrapartida a esta falha, Feldman propõe em sua pesquisa de campo em New Bedford (EUA) um enfoque alternativo: entender vidas migrantes a partir da interação entre experiências históricas, condições estruturais e ideologias de seus países de origem e recepção. Ou seja, como essas mulheres (re) constroem suas identidades ao "nível do eu" diante de mudanças dramáticas, determinadas pela imigração e o confronto com valores culturais muitas vezes conflitantes no que se refere a gênero, classe, etnicidade, geração e idade.

Portanto, para Feldman é necessário considerar como, a partir da “diferença cultural” imposta pela migração, mulheres e homens imigrantes reinterpretam e simbolizam o seu passado na terra natal e no novo contexto, para então captar as complexidades que envolvem a (re)construção de classe, etnicidade, e gênero.

Logo, ainda que ela não use propriamente o conceito “interseccionalidade”  tal como é hoje empregado no campo dos Estudos de Gênero, é possível identificar como esta mesma ideia é fortemente presente em sua etnografia. Feldman entende que a identidade da mulher imigrante se dá na articulação de uma diversidade de processos de construção e reconstrução das categorias gênero, etnia, classe e geração, e reivindica que esta articulação seja analisada ainda em meio à especificidade da “intersecção de culturas”. Sua crítica revela sua preocupação em entender os processos culturais também como um eixo que influencia a construção destas categorias e identidades. Em sua abordagem interseccional, Feldman mostra-se mais interessada em entender o complexo processo de categorização/formação de identidades do que nas categorias per se.

Tradicionalmente, muitas abordagens interseccionais contemporâneas seguem priorizando a intersecção de categorias clássicas como “gênero”, “classe”, “etnia/raça”. No caso de estudos sobre migração, o trabalho de Feldman revela a importância de se pensar junto a estas categorias também seus processos de construção no contexto da “intersecção de culturas“. 

Fontes

Feldman-Bianco, B. (2009). Multiple Layers of time and Space: The Construction of Class, Ethnicity and Nationalism among Portuguese immigrants, 01/2009, "Building Ethnic Communities: Portuguese American Communities along the Eastern Seabord", Capítulo, ed. 1, University of Massachusetts - Center for Portuguese Studies, pp. 44, pp.49-92.

Feldman-Bianco, B. (1993). A saudade da terra na América: memória cultural e experiências de mulheres portuguesas na intersecção de Culturas, 09/1993, Encontros de Antropologia (Universidade Federal do Paraná e SESC da Esquina), Vol. S/N, Curitiba-PR, PR, Brasil.

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